terça-feira, maio 20, 2008

Best-seller

O poeta quis, por várias vezes, escrever pra ela, ou sobre ela. Ela sempre o inspirou em diversas coisas. Mas... pra escrever, não. Definitivamente. Talvez a pressão, a obrigação e todo aquele desinteresse pelas coisas escritas que ela demonstrou desde o começo. Aqueles sentimentos, toda a história romantizada do passado aflorado pelos meios tecnológicos, nada disso parecia inspirá-lo. Naquela cabana, velha, úmida e mofada, acompanhado por algumas garrafas de uísque e por nenhum gelo, tentava, enfim e em vão, terminar aquele livro. Lhe faltava agora a inspiração que há pouco ainda restava, que a moça de cabelos bem pretos levara embora. Tudo parecia muito complexo e aquele livro, de escrita rebuscada, ia ganhando um insuportável ar pesado que acabaria por torná-lo impossível de se ler.

Lembrou da menina ruiva, que vira dias atrás e com quem falou de forma bem polida, antes de decidir se isolar naquela montanha. Lembrou de como se deram bem, cativaram amigos em comum e, aos poucos, foram se afastando, deixando que as intrigas fossem mais importantes. Hoje, se respeitam e até brincaram com uma certa dívida de honra que ele tem e que ela insiste em não considerar. Preferiu dormir, mais embriagado por seus pensamentos do que pelas incontáveis doses "cowboy" que bebera durante toda a noite. Fez todo esforço e caiu no sono pensando na menina especial com quem tentava, mesmo sem saber, acender de novo qualquer vestígio de ser humano que ainda havia dentro dele. E como os sonhos pregam peças inimagináveis, sonhou com uma pessoa do passado, dessas que a vida trata de nos afastar. Ele estranhou, nem sequer pensa nela. Haviam se visto há algum tempo em uma viagem, mas nada além disso.

Acordou no outro dia já de tarde, preso à cama por uma ressaca massacrante, dessas que temos depois de uma noite de porre, embasada pelo fim de um romance mal resolvido que na verdade nunca começou. Lutou bravamente com o edredom e foi pôr qualquer coisa pra ocupar o vazio no estômago. Foi aí que lhe surgiram os flashs da noite anterior, assim sem muita lógica e totalmente fora de sequência. Lembrou sobretudo da menina do passado, de como ela havia sido tão especial há tanto tempo atrás. Sabia por outros que ela havia casado com um cara escroto, que estava muito bem no trabalho e que havia tido uma filhinha linda. Aquele tempo frio, a ressaca e todos aqueles pensamentos amargos acabaram sendo a única inspiração para o trágico fim daquele trabalho já tão penoso. Voltou para a cidade, entregou seus manuscritos e foi se isolar em uma praia deserta, pra continuar fugindo do mundo. Por muito tempo não quis saber do resultado, mas podia imaginar um fracasso sem tamanho.

Um comentário:

Andrea Araujo disse...

Mario, também adorei seu blog! Com certeza estarei sempre por aqui! Ah, te adicionei! Bjos