terça-feira, julho 22, 2008

Sonhando acordado.

Fazia frio. A calefação com defeito e o edredom velho não ajudavam. No velho piso de madeira pingava de instante em instante uma goteira pela fresta da janela com defeito. Da porta do quarto tudo que se via era a cama estreita e desarrumada, uma pequena cômoda e uma mala sobre ela, o que fazia supor que ou estava ali de passagem ou simplesmente não tinha muitas posses. Um velho gravador tocava uma música meio lenta, com uma batidinha suingada e uma melodia com uma voz amável. Destoava. A música definitivamente não era uma trilha sonora condizente com aquele caos. Letra triste, mas era até alegre.

As coisas não podiam ser fáceis, não teria sentido algum. Seria talvez tão previsível quanto encontrar ali abertamente o que estava pensando daquilo tudo. Acordou ainda um pouco tonto, atordoado com tanta informação, mas preferiu ficar deitado, pensando na vida e em como passaria por aquilo tudo. Dormiu e acordou ainda várias vezes naquela mesma tarde, numa tentativa infantil de fazer aquele pesadelo voltar a ser um sonho lindo. Levou muito tempo pensando em como poderia falar tudo o que estava pensando, mas nem ele mesmo sabia, não podia formatar a confusão de sentimento que poluia sua mente.

Lembrou várias vezes dos encontros escondidos e deixou-se levar pelo sono. Assim conseguia sonhar com ela, com o seu cheiro, com o toque do seu cabelo lindo e liso. Pronto! Tudo estava certo, normal. Mas aí de súbito acordava novamente e caía em si, percebendo o inferno no qual estava mergulhado. E nessa sequência desgastante, da euforia à decepção, enfim dormiu até o outro dia. Acordou incomodado pela luz do sol que entrava pela tal fresta na janela, que ia bater ironicamente bem no seu rosto. Ainda pensou, mas não fez muito esforço para achar que tinha sido apenas um sonho ruim. Encarou de frente e foi viver o seu dia.

Parecia mais vivo que de costume, mas continuava achando que sua vida não estava fazendo muito sentido. Quase nada lhe empolgava mais como antes. Sentou num banco esperando o ônibus e passou a reparar numa conversa torta do casal ao lado. Uma linda historinha piegas sobre um casal de velhinhos que tinham uma forma bem particular de demonstrar carinho. "Haverá de ser pra sempre". Escreviam isso e guardavam nos lugares mais inusitados, a fim de surpreender o outro. O rapaz, nitidamente interessado em impressionar a mocinha com a história bonita, contava as situações mais românticas sobre o casal de velhinhos. Mas aí seu ônibus chegou e não teve como ficar para ouvir o final daquela novelinha. Tomou a condução, sentou no último banco e continuou a pensar na sua vida. Pra que mentir? Será que também era mentira? Por que não pode ser fácil? O passado volta? Ou seria só um novo futuro, comum? Bem! Isso ele só vai saber quando acordar.

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